sábado, 4 de abril de 2009

COM ESTA LEI - TODOS SÃO ABSOLVIDOS

A função Judicial
Público de hoje:

Avelino Ferreira Torres acaba de ouvir o acórdão que o absolveu de seis crimes (corrupção, peculato de uso, abuso de poder e extorsão) que lhe eram imputados. “Esta decisão fundamenta-se na prova produzida nesta sala e não no que se diz lá fora e no inquérito”, afirmou a juíza presidente Teresa Silva.

No acórdão dos três juízes ressalta a pouca ou nula credibilidade dada ao depoimento da principal testemunha de acusação José Faria. Esta testemunha que chegou a atentar contra a própria vida e correu riscos de morte no Brasil não levou ao tribunal factos susceptíveis de sustentar a acusação do Ministério Público. Segundo a juíza presidente, Faria exprimiu várias versões e a perícia psiquiátrica a que foi sujeito conclui que ele estava em condições de depor mas não validava o que ele dissesse.

Este caso singular, mais a proclamação da juíza presidente do colectivo, merece reflexão, mesmo a quente e apenas com aquilo que se conhece dos jornais e do que se "diz lá fora".

A primeira observação singularíssima é a de que a decisão não se baseia no inquérito, confessadamente. E legalmente também, porque o código de Processo Penal que temos, a isso obriga: a uma repetição integral, na audiência de julgamento, de toda, mas mesmo toda a prova recolhida num inquérito criminal.

O que não significa que toda a prova recolhida num inquérito de nada sirva ou possa ser deitada ao lixo da irrelevância.
Há perícias de várias ordem que o tribunal tem a obrigação de ler e reler e perceber, em sede de julgamento. E se não perceber, deve perguntar, oficiosamente e não esperar que apareça por encanto a explicação.
Aconteceu isso, no caso concreto? Não sabemos, mas aceitemos que sim e desvalorizemos por isso a proclamação judicial a que falta a menção a essa nuance, para dizer assim.
Há ainda prova documental que é recolhida no inquérito e que o tribunal deve considerar, vendo, percebendo e relacionando. Prova por escutas válidas, prova por relatórios e mapas, números e referências escritas.
Foi isso que sucedeu? Aceitemos que sim, porque sim, embora não se entenda aquela proclamação assim-assado, desse ponto de vista.

E quanto à prova testemunhal e por declarações prestadas no inquérito? Isso, vale quase nada. Essa prova tem de repetir-se na audiência e tem acontecido amiúde que algumas testemunhas "num s´alembram" de nada, depois de terem sabido tudo. E isso acontece em audiência de julgamento, sem grandes consequências. Nestes casos, a prova testemunhal revela-se essencial, porque partem geralmente de denúncias de rivais, de prejudicados e ofendidos que sabem coisas que vão repetir em julgamento. Esses depoimentos costumam ser escalpelizados por advogados e magistrados. Tornam-se essenciais, mas a sua valorização é muitas vezes relativizada, pelos mais diversos motivos. Mente-se muito nos tribunais portugueses, sem consequências de espécie alguma.
E pçortantoe nada acontece de especial, a esses mentirosos, porque Figueiredo Dias e a comissão do CPP assim o quiseram. Em nome da imediação das audiências, da oralidade e presencialidade das testemunhas que depõem.

Portanto, há dois aspectos a considerar neste caso singular: a absolvição deste arguido resultou da audiência e respectiva prova produzida. Uma das que teve maior relevância foi a de uma testemunha-chave. Que afinal não serviu para abrir aquela porta. O tribunal retirou-lhe credibilidade e a porta continua fechada.
Valerá a pena perguntar, indagar, se o tribunal teve razão nessa desvalorização do depoimento? Não vale a pena, porque é assim mesmo: o tribunal assentou a sua convicção das provas (não) produzidas e uma delas foi essa. Ninguém vai agora perguntar ao tribunal se nas audiências se fez o que havia a fazer, porque se admite presumivelmente que sim. Mas será mesmo assim?

Portanto, o assunto, para atalhar razões de fundo, resume-se a isto:
O Inquérito realizado pela PJ, sob alçada do MP, foi bem feito? Esgotou todos os meios de prova admissíveis? Seria possível fazer mais e melhor?

Não sabemos e não é esta decisão que no-lo diz nem pode dizer integralmente, pelo facto de as provas terem de ser produzidas e avaliadas em audiência.
Partindo do pressuposto que as provas indiciárias seriam suficientes para uma condenação, se se mantivessem em tribunal, ficcionando-se essa eventualidade, porque é esse o critério para avaliar a validade intrínseca de uma acusação do MP, resta saber o que falhou e onde falhou.

Se os pressupostos de uma acusação são os indicados, então o que falhou foi a audiência de julgamento. E porquê?
Ora, isso é que seria interessante perceber, mas a proclamação da juíza não no-lo diz com clareza, mas o acórdão explicará melhor. Ora, não temos o acórdão. Só temos a proclamação mediática...

Por isso, é preciso que alguém o vá saber e informe, sendo certo que o caso ainda não transitou em julgado. Aliás, esta apreciação concreta, não o é de todo: baseia-se apenas no escândalo que estas decisões provocam e colocam em causa todo o sistema de justiça.

Se falhou, onde falhou? Terá sido Ferreira Torres acusado injustamente dos crimes? Terá existido mais uma cabala?

Para se entender melhor, vejamos os factos, tal como apresentados nos jornais da época. É preciso dizer que "a época" dos factos, já ocorreu há anos. Os factos são de 2001-2003, a acusação é de 2007 e a sentença definitiva será para as calendas. Isto também é um problema da justiça e junto aos outros, forma um grande, grande problema que é preciso resolver.

Portanto:
Segundo o MP, António Vieira, gerente da firma Vieira, Esposa e Filhos, Lda, foi coagido por Ferreira Torres depois de ter recusado a proposta de um intermediário seu para comprar a quinta Sorte da Vinhola por 200 mil euros.
O negócio previa o pagamento em dois anos (com a promessa de poder construir na propriedade), mas o empresário recusou porque, na altura, em 2001, estava em dificuldades financeiras.
Após a recusa, António Vieira terá sido contactado directamente pelo então presidente da câmara, que o ameaçou de que se não adquirisse a quinta, já não por 200 mil, mas por 350 mil euros, não receberia, durante muito tempo, os 1,25 milhões de euros que a câmara lhe devia. Um ultimato que, de acordo com a acusação do MP a que a Lusa teve acesso, o empresário acabou por aceitar, tendo feito os pagamentos ainda em 2001.
O negócio foi escriturado em Março de 2003, por 99 759,50 euros, menos 250 240,50 euros do valor efectivamente pago. A empresa de António Vieira recebeu da autarquia cerca de 641 mil euros, praticamente metade do valor em dívida. Outro caso, no âmbito deste processo, reporta-se à pavimentação de um acesso à Quinta do Portinho, onde, alegadamente, foram utilizados homens e máquinas da câmara.
Como contrapartida, feita pelo ex-presidente, o proprietário, Martinho Sousa, deveria pagar 30 mil euros à autarquia e outros 30 mil ao Futebol Clube do Marco, contra recibos.
O cheque destinado à colectividade foi entregue ao vice-presidente e o que deveria entrar na câmara depositado numa conta de Ferreira Torres Também neste processo, Ferreira Torres é acusado de lucrar milhares de euros na compra e revenda de vários terrenos florestais e agrícolas, usados depois para construção.|

- posted by josé @ 26.3.09 8 comments
in portadaloja

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